Brasileiro não tem medo de morrer queimado

Brasileiro não tem medo de morrer queimado

Estou cada vez mais convencido que brasileiro não tem medo de morrer queimado. Em edifícios comerciais, shopping centers ou mesmo condomínios residenciais a linha de raciocínio normalmente é essa:

Prioridade alta: Controle de acesso. Se as catracas param de funcionar, é uma calamidade. Até o presidente/gestor/síndico se envolve. Todo mundo acha que sem controle de acesso, todo tipo de ladrão, bandido e mal caráter vai entrar a qualquer momento.

Prioridade média: Sistema de CFTV. As imagens podem não ser muito boas, algumas câmeras podem estar fora do ar, mas se no geral estiver gravando alguma coisa, estão tudo bem. Afinal o ladrão não vai saber quais câmeras estão funcionando ou não.

Baixa prioridade: sistema de alarme de incêndio (SDAI). Tem um detector que esta alarmando toda hora? Desativa ele. Tem um local onde está difícil passar o cabo do laço de detecção para conectar um detector? Cola o detector no teto com fita dupla face que ninguém vai saber. E por ai vai.

E não é por falta de ocorrências:
http://www.terra.com.br/noticias/educacao/infograficos/incendios-vcsabia/

Inclusive o Brasil aparece várias vezes nas listas de piores incêndios da história:
https://en.wikipedia.org/wiki/List_of_fires

O interessante é que os países desenvolvidos estão cada vez menos presentes nessas listas. Você pode perceber uma grande presença deles nas estatísticas até década de 60, e depois uma grande queda, devido entre outras coisas as ações tomadas pelos governos.

Responsabilidade Diluída

Nos países de primeiro mundo, a responsabilidade (no caso de um acidente) é de todos que tinha alguma autoridade. Se um guindaste cai e machuca alguém, desde o operador até o dono do guidante são responsabilizados em algum nível. Não existe desculpa do tipo "eu não sabia".

Já no Brasil o nosso sistema jurídico é lento e aparentemente mal preparado para esse tipo de situação. Em nenhum país do mundo existe uma lei que diga "se o operador deixar a máquina ligada por mais de 24 horas e por conta disso houver um desgaste excessivo do motor que cause a queda do guidantes, ele deve receber pena de 5 anos de prisão", no entanto isso não impede que responsáveis sejam punidos. Em países mais desenvolvidos, de grosso modo, as leis indicam de maneira genérica qual como deve ser tratado cada crime/infração e cabe ao juiz usar o bom senso para punir cada responsável. No Brasil, um dos problemas é que aparentemente se não houver uma lei tipificando claramente cada detalhe do crime/infração (ou se o réu não se declarar claramente culpado), o juiz não consegue punir o réu.

Dessa forma no Brasil temos uma impunidade geral em qualquer crime que seja um pouco mais complexo do que um roubo de galinha. Isso vale para crimes de corrupção, responsabilidade (ou irresponsabilidade) civil, etc. Nesses casos mais complexos o advogado de defesa normalmente consegue chegar com uma tese (muitas vezes até muito mal ajambrada) para livrar o réu.

Isso vale também para crimes de responsabilidade em caso de acidentes ou mesmo mortes por incêndio. Se o sistema de detecção não funcionou, de quem era a culpa? Do bombeiro do prédio? Do síndico? Do zelador? Do instalador? Todos vão ter a sua desculpa: o bombeiro avisou o síndico, o síndico acionou o instalador, o projeto do instalador não cobria a manutenção, o zelador não sabia que precisava contratar manutenção e por ai vai. Assim é o efeito "cachorro-com-dois-donos-que-morre-de-fome".

Usuários Crédulos

Os usuários do prédio/shopping center/condomínio confiam (será que talvez de maneira irresponsável) no bom senso e responsabilidade dos administradores. Não existe muito que um usuário possa fazer de maneira passiva para saber se um sistema de incêndio está funcionando corretamente ou não.

Em uma boa central de incêndio é possível olhar o painel para saber se existe algo anormal, porém isso não é maneira prática dos usuários verificarem o seu funcionamento porque:
1. as centrais de incêndio tem visores pequenos e são instalados em locais de difícil visualização ao público em geral
2. os usuários não tem treinamento para identificar corretamente as mensagens mostradas no visor
3. as centrais tem recursos que permitem ao operador cancelar mensagens e alarmes, ou mesmo desabilitar detectores que causem, por exemplo, muitos alarmes falsos.

Sendo assim é complicado para os usuários conferir o correto funcionamento de uma central de detecção. Na verdade, mesmo para os profissionais do corpo de bombeiros muitas vezes é difícil identificar se o painel de incêndio foi configurado para anular alguma mal funcionamento importante.

O que fazer? 



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